Eu nunca sei o que dizer

A tarde estava chuvosa, coisa que para alguns era muito desagradável, para mim era excelente. Desde criança, quando a chuva chegava eu corria para janela para sentir os pingos d’água caírem em minha mão, cada gota me trazia um pouco de vida, e hoje mais que isso, a percepção de que coisas pequenas e rotineiras ainda me tocam da mesma forma que antes inunda meu coração. 

Andei como sempre apressada pela rua, meus pés quando os meus pensamentos estão longe tendem a criar uma espécie de vontade própria (vontade que compartilhamos) de andar até que tudo termine, de correr livre até o fim da estrada e além. Eu amo caminhar, e também com os pensamentos. 

Naquele momento pisei mais uma vez, distraída em uma poça de água, meus pensamentos caminhavam pelo futuro, as mesmas perguntas de sempre: “O que farei?” “Qual caminho tomarei?” “Qual será o fim da minha história…” 

O problema é que quando se caminha demais com os pensamentos, os olhos se fecham para os outros caminhantes ao lado. Agora, solitária, me pergunto: “Será que alguém reparou em mim? Aquela garota estranha de sorriso meio louco, toda descabelada e que andava como se gostasse da chuva...” Em meio ao devaneio me peguei pensando no que diria se encontrasse nessa tarde algum pedaço do meu futuro. Talvez eu diria oi, ou me conhecendo bem olharia assustada e logo em seguida seguiria meu caminho, mas se esse pedaço do meu futuro realmente iniciasse um diálogo eu sei que não teria o que dizer. Em geral sou boa com as palavras depois, quando elas já não podem mais ser ditas. 

Eu nunca sei o que dizer, talvez por uma incapacidade patológica, mas acho que se encontrasse o pedaço do meu futuro… ou melhor, aquela pessoa que tem nome, endereço, cheiro e vontade própria naquela rua, quando eu estava distraída e descabelada em consequência da chuva, sei o que me calaria: o coração. 

Quando esperamos algo, mesmo sem admitir realmente, quando chega a acontecer (e sim acredito que nossos sonhos mais absurdos, e desejos mais profundos, se realizam se acreditarmos cegamente) o coração reconhece de fato o que já desejou tanto, como se encontrasse consolo pelo tempo de espera, angústia e incerteza, e mesmo nunca admitindo isso com palavras claras, sei do meu coração, ele tende a disparar nos momentos mais inoportunos, lançado adrenalina no sangue, congelando o cérebro e me incapacitando de falar um simples “Já sabia que iria te encontrar”. 

Claro, a tarde passou e meu futuro ainda parece tão distante quanto no dia anterior, mas tenho a impressão que essas coisas desconhecidas como o tempo e os sonhos são tão caprichosas que se esperarmos que aconteçam em um dia chuvoso elas acontecerão em um dia claro. Porque afinal se estivéssemos preparados o coração não dispararia, e não teríamos convicção de que o sonho, desejo, encontro, pedaço de futuro ou seja o que for, estaria ali, na nossa frente esperando um simples “Oi”.
26 de novembro de 2011

Ana Marques

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