Carta aberta

Por que você parte meu coração? Você não vê que isso está nos matando? Você não enxerga que esses anos parecem um tormento interminável? Sempre acredito que dessa vez vai. Dessa vez vai ser diferente. Mas, não. Você sempre me decepciona. 

E o pior de tudo é que eu não sei o que sentir. Te amo pelo laço que nos une. Te odeio pelas feridas que você aflige as pessoas mais preciosas deste mundo. Eu sei que sua vida foi penosa, mas a essa altura você já teve muitas, muitas chances de transformar toda a maldade, a miséria, a desesperança em algo bom. 

E se eu consigo levantar todos os dias e caminhar, por que você não consegue? Você acha que sua vida foi difícil, mas foi você quem escolheu o seu caminho. O que eu escolhi? Eu escolhi acordar na madrugada e saber que você não estava lá? Eu escolhi ouvir vozes exaltadas, sendo esquecida em bancos de escola e em quartos escuros? Eu escolhi te ver definhar, depois enxergar a carne voltado, como se estivesse saudável outra vez, só para depois ver os ossos proeminentes novamente? Eu escolhi amar as pessoas que você colocou no meu caminho apenas para ver você as deixando para trás, como se fossem mais um dos seus pertences que foram perdidos tantos anos antes?

O que eu faço com você? Eu te rejeito? Como posso? Como posso deixar de te amar se você é parte de mim? Mas, você não parece me amar. Eu te olho e penso que você não ama ninguém. Nem a si mesma. Por quê? Você tem tanto potencial. Poderia ser qualquer coisa. Mas sempre escolhe colocar a culpa no passado pelos seus erros constantes. Você já notou isso? Já notou que sempre faz as mesmas coisas. Você está dentro de um ciclo de destruição, mas porque nos arrasta junto?

Estou tão cansada que já quis te esquecer. Tão cansada de ser espectadora do seu espetáculo de morte que já quis te riscar das minhas preces. Eu só queria que você pensasse um pouquinho. Eu tive família? Eu me lembro claramente de todos os anos sendo deixada de lado por estranhos. Eu deixei de amar alguém por isso? A negligência, o alcoolismo, a necessidade de sustento que impedia o cuidado diário. E tudo isso com o agravante de não saber se você tinha um teto. E depois suas crianças. Eu tenho pavor do que pode acontecer a elas tento tão menos do que eu tive. De todas as pessoas você devia saber como é. De todas as pessoas você devia ser a primeira a lutar pelo seu sangue.

Eu estou cansada. Já não acredito que você possa mudar. Eu te amo, mas não te suporto mais. Eu não tenho forças para suportar. E você nem liga. Acho que nunca ligou. 

Ana Marques

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