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Sei lá, Alisson, tu sabe que eu odeio esse tipo de circo. A galera aplaude cada coisa. Antes eu via o brasileiro como uma massa homogênea de paixão, determinação e esperança. Mas, sempre que eu me vejo rodeado dessa galera eu não consigo negar que antes eu era ignorante. Isso que dá a gente viver na bolha.

E no fim, ainda tem uma ou outra esperança. Eu chamo de filhos do desespero. Nessas reuniões, sempre encontro um ou outro, passe a reparar, eles estão sempre encarando a saída.

O que entrega mesmo é o olhar. Esses desesperados, os verdadeiros brasileiros, sabem muito bem que eles lá só ligam para encher a própria pança. No fim, esse olhar tão evidente que torna desconhecidos espíritos amigos, é sempre fruto de um desamparo maior. Pode ser alcoolismo, fome, insegurança, discriminação. Não dá para bater o martelo quando todo mundo acaba tendo uma vida difícil por aqui.

Sei o que tu vais dizer, que o resto do povo não tem como saber. Esse olhar a gente só estampa depois de ver a tragédia comum. Mas, sei lá, saber como pode ser ruim faz a gente se agarrar a esperança de um futuro com toda a determinação. 

Acho que chego aqui a conclusão de que para ser é preciso viver. Acho que o problema nem são os privilégios e toda essa coisa. Essa galera não vive de verdade, Alisson. A bolha deles nunca foi estourada, por isso acho que eles nem têm ideia de como é o mundo real. 

Ana Marques

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