1460 dias

Tudo começou com uma concessão. Algo pequeno, deixa passar, logo tudo vai melhorar. Mas nada melhorou, pelo contrário. Como grande caixotes retangulares empilhados, nossas derrotas se acumularam. 

Da árvore só brotou frutos pobres. A seiva sangrava ácida, queimando a vegetação. A esperança foi ficando mais escassa, aquela justificativa de salvar inocentes não colava mais não.

Isso porque já não havia inocentes. A ternura, a ingenuidade e a criatividade foram fuziladas na primeira hora da manhã.

Até existia uma rota de fuga, mas se espalharam pelas mãos um mapa que levava para terras fantasmas. Um mapa cheio de conquistas mentirosas, que no fim cegava quem o visse para qualquer outra opção.

E o que fazer? Engolir o medo. Pesar na balança o que mais tem importância. Toda a vida ou o zelo por aquilo que é mais valioso do que esses poucos anos passageiros a deriva?

Não existia dúvida. O caminho dos renegados era a certa decisão. Foi por lá que o Salvador havia passado. Tomar outro rumo era fora de questão.

Que nos matem neste corpo, declaram. Que nos envie para a falsa perdição, desafiaram. A firme convicção de que era sempre  melhor ser perseguido, do que virar o monstro da perseguição. 

Ana Marques

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