O sonho que nunca

Em teoria eu embarco amanhã para a minha primeira viagem internacional. Sim, ainda estou com medo de não me deixarem embarcar, mesmo com todos os documentos possíveis, são tempo de COVID.

Minha ansiedade às vezes me faz pensar que vou morrer, que estou morrendo. Mas todo mundo está morrendo. Enfim, caso eu vá e não volte naquele avião, queria ter algumas coisas para dizer.

Mas acho que não tenho não. Se os meu dias acabasse agora a única coisa irritante seria deixar tantos livros não lidos. Será que a gente vai poder ler Tolstói no céu?

Eu tenho a paz de saber que fiz tudo que eu podia para os que eu amava. Tenho a consciência de que minha ausência deixaria marcas, mas não seria devastadora. A beleza de uma vida insignificante, banal, é que a gente causa menos dano.

Espero ter causado o mínimo de danos. Claro, eu quero voltar da viagem. Quero ler Senhor dos Anéis até o fim. Quero beijar alguém que me faça rir. Mas minha caixinha de sonhos é só uma coisa que eu olho de vez em quanto. Morrer, isso sim seria uma aventura tremendamente grande.

Agora, rumo a segunda estrela a direita, sempre em frente, até o amanhecer. Estou vivendo o sonho que no passado parecia impossível, uma abstração nunca atingível. Se nada der certo, eu estou feliz por ter tentado. Se nada der errado, estou extasiada pelo sonho realizado. 

Ana Marques

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