Novembro chuvoso

Meu pai chegou aos 50. Quando eu lembro que com a minha idade ele já tinha duas filhas, fico um tanto chocada. Além disso, sinto falta dele, questiono constantemente se vale a pena morar tão longe.

Eu tenho esse compromisso moral de pelo menos escrever uma vez no mês, mas os últimos dois anos têm matado qualquer vontade de manter essa promessa. Além disso, questiono frequentemente se vale a pena expor meus sentimentos desse tanto.

Há tanto eu fui deixando os pontos de inspiração para trás. Ou eles me deixaram. Agora eu acho que todo texto de amor foi um desperdício e também de grande proveito. A cada dia me torno mais crente de que o amor que sinto já é suficiente. Não para dois, mas para essa vida de solista que só ouve não.

Às vezes, me lembro de quem já amei. Tanta gente ficou pelo caminho. Parte de mim ainda conserva resquícios de amor. Mas eu não tenho o mesmo coração depois de tanto tempo. Para cada amor um coração, para cada decepção um longo processo de descrença e crescimento. Eu cresço e cresço, mesmo que pareça que só faço diminuir.

Eu amei em 2021. Foi extraordinário de algumas formas, rendeu um bom tanto de lembranças que até valem a pena guardar. Mas já é novembro, o ano já vai acabar e eu quero deixar mais essa decepção quando janeiro chegar.

Choveu bastante o mês todo. Trouxe uma percepção tão clara de como as estações passam rápido. Mal lavei as roupas de inverno e agora as chuvas de verão me pegam quase chegando em casa. Novembro é repleto de bons dias, mas são sempre os ruins que sobressaem. Talvez por isso escrever não seja mais uma prioridade. Quem eu vou amar quando eu chegar aos 50? Todos eles, mas, além disso, nenhum deles. Especialmente porque a gente tem que deixar quem não nos ama para trás quando janeiro chegar.

Ana Marques

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