Um funeral, um assalto e um B.O.

Querido amigo, têm sido dias de calor. Eu sei que prometi escrever pelo menos uma vez ao mês, mas queria ter algo além do que notícias ruins para contar. Vovó morreu. Fui assaltada. Minhas mãos estão atacadas com aquela alergia. E está calor. Têm dias que parece que o mundo está acabando.

E ele acaba para alguns. Em tempestades tropicais e vulcões despertando. Em finalmente chegar ao final dos seus anos. Em querer desistir da humanidade depois que ela te lesiona. O mundo está acabando sempre.

Por isso é estranho, quase bizarro, ainda achar algum motivo para sorrir. A gente consegue achar alegria mesmo em meio a dor. E eu sinto que cresci demais sem nem notar. Claro, estou já nos quase 30, mas sentar naquela delegacia decrépita esperando para fazer um B.O. deixou isso bem claro. Sem chorar, eu não gosto de dividir minhas lágrimas com o mundo.

Chorei só para mim. Chorei tanto, com o coração partido, mais pela solidão da maturidade do que pelo que perdi. Mas agora já está tudo bem. Não tem como não ficar. Estar bem é obrigatório. 

Espero que você esteja bem, de verdade, não só porque precisa estar. No início da semana eu fiz planos de fuga do país, mas só se você for comigo. Se você for eu vou, eu vou. 

Mas não mesmo, porque eu sentei sozinha naquela delegacia. Eu estava sozinha naquela esquina. Eu tive que ir sozinha dizer adeus. Então adeus, meu amigo, espero que você só tenha notícias boas.


Ana Marques

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